Objetivos: Este estudo objetivou verificar a prevalência de sonolência excessiva diurna (SDE) em pacientes com distúrbios respiratórios do sono, bem como investigar a sensibilidade e especificidade da Escala de Epworth em detectar a presença de Síndrome da Apneia/Hipopneia Obstrutiva do Sono (SAHOS) e correlacionar o Índice de Apneia e Hipopneia (IAH) com o grau de SDE, e a idade com a gravidade da SAHOS e com o grau de SDE. Método: Procedeu-se um estudo transversal com coleta de dados retrospectivo, mediante análise de prontuários. Os sujeitos foram agrupados em dois grupos e três subgrupos de acordo com o IAH. A análise descritiva deu-se através de médias, desvio padrão e tabelas 2×2, e a estatística por meio da Correlação de Pearson. Considerou-se p<0,05. Resultados: Dos 65 indivíduos estudados 68% eram do sexo masculino, com idade média de 55,18 anos, IAH de 34,31 eventos/hora, e pontuação na SDE de 9,63. A SDE foi prevalente em 52% da amostra, em especial no grupo controle, demonstrando pouca sensibilidade na detecção da doença. Ao correlacionar IAH com idade, encontramos uma correlação fraca, negativa e estatisticamente significativa. Conclusão: A SDE mostrou-se prevalente em mais da metade da população. Entretanto, a Escala de Epworth demonstrou pouca sensibilidade para SAHOS, não podendo, portanto, ser utilizada, sozinha, como critério para detecção da doença. Ressaltamos a necessidade de novos estudos para melhor elucidação nos assuntos tangentes à sonolência excessiva diurna, visto que esta associa-se à ocorrência de acidentes, morbidades, e vem se tornando um problema de saúde pública.
Palavras‐Chaves: Distúrbios do Sono por Sonolência Excessiva; Síndromes da Apneia do Sono; Transtornos do Sono
*Autor para correspondência: graciellepampolim@hotmail.com
O sono é considerado uma necessidade vital à vida humana. Representando papel de fundamental importância para a preservação das condições homeostáticas e para o funcionamento físico e psíquico, sua qualidade e quantidade são essenciais para o desempenho das funções cerebrais e orgânicas. Desta forma, fatores que interferem no sono determinam repercussões significativas na vida do indivíduo.1
De acordo com Dal-Frabbro et al,2 a Síndrome da Apneia/Hipopneia Obstrutiva do Sono (SAHOS) é um dos distúrbios respiratórios do sono mais prevalentes na população, sendo inicialmente descrita em 1973 por Cristian Guilleminault.
A SAHOS é uma condição clínica que se caracteriza por repetitivas obstruções das vias aéreas superiores (VAS) em decorrência de um colabamento inspiratório total (apneia) ou parcial (hipopneia), que leva à diminuição dos níveis séricos de oxigênio e aumento dos níveis de gás carbônico, resultando em microdespertares, impactando na qualidade do sono, e interferindo nas atividades de vida diária.3,4
Abreu et al5 afirmam, ainda, que a SAHOS está associada ao desenvolvimento de hipertensão arterial sistêmica e uma série de outras condições cardiovasculares, como insuficiência cardíaca congestiva, arritmias, doença coronariana e acidente vascular encefálico.
O diagnóstico da SAHOS é determinado pelo índice de apneia e hiponeia (IAH) acima de 5 eventos por hora de sono, obtido através da polissonografia, que é o exame “padrão-ouro” para diagnóstico de desordens do sono. Este índice permite ainda classificar a SAHOS em leve, moderada ou grave.4,6
A literatura posta aponta que os fatores de risco para SAHOS incluem: sexo masculino, idade superior a 50 anos, obesidade, aumento do volume do pescoço, alterações craniofaciais, fatores genéticos, hábitos alcoólicos e tabágicos, e consumo de fármacos como sedativos e hipnóticos.7
A manifestação clássica da SAHOS é a sonolência excessiva diurna (SDE). Definida clinicamente como dificuldade para manter um nível de alerta desejado ou como uma quantidade excessiva de sono, a SDE é relatada pelos pacientes através de queixas de cansaço e falta de energia.3,5
A SDE dificulta a realização de atividades corriqueiras, causa diminuição da memória e concentração, déficit de aprendizado, causa tendência ao nervosismo e/ou depressão, dor de cabeça, hiperatividade (em crianças), constrangimento social, problemas sociais e impotência sexual, pode apresentar-se também como uma dificuldade para sustentar atenção e vigília em tarefas monótonas como assistir TV e ler um livro.4,8
A Escala de Sonolência de Epworth (ESE) é amplamente utilizada para avaliar subjetivamente a SDE. A ESE foi desenvolvida por Johns em 1991 e trata-se de um questionário autoaplicável, que avalia a probabilidade de adormecer em oito situações envolvendo atividades diárias como ler, assistir TV, sentado em lugar público, conversando com alguém e/ou após uma refeição, entre outras. O escore global varia de 0 a 24, e quando acima de 10 sugere a presença de SDE.4,9
Tanto a SDE quanto a SAHOS são comumente associadas a acidentes automobilísticos, domésticos e de trabalho, bem como ao agravamento ou início de doenças cardíacas que levam a um alto nível de morbimortalidade da população. Assim sendo, a importância da realização deste estudo está centrada na necessidade de aprofundar os conhecimentos de profissionais da saúde e da sociedade nos assuntos tangentes à SDE e a SAHOS, que rapidamente se tornam um problema de saúde pública e ainda permanecem relativamente pouco conhecidas.
Destarte, objetivou-se neste estudo verificar a prevalência de SDE em pacientes com distúrbios respiratórios do sono, bem como investigar a sensibilidade e especificidade da ESE em detectar a presença de SAHOS e correlacionar o IAH com o grau de SDE, e a idade com a gravidade da SAHOS e com o grau de sonolência excessiva diurna
Procedeu-se um estudo transversal com coleta de dados retrospectivo, realizado no Centro de Tratamento de Distúrbios do Sono – RespirAR, em parceria com o Centro de Medicina do Sono – MEDSONO.
Os dados foram coletados na RespirAR mediante análise de prontuário, utilizando-se uma ficha de coleta de dados, preenchida pelas pesquisadoras, que continha itens referentes ao perfil do paciente (sexo, idade), dados do estudo polissonográfico (IAH) e da Escala de Epworth (SDE).
Foram incluídos no estudo os pacientes adultos, de ambos os sexos, que deram entrada na RespirAR no período de janeiro de 2009 a junho de 2013, e que realizaram o exame de Polissonografia Basal Noturna e responderam à Escala de Epworth. Foram excluídos do presente estudo aqueles pacientes em que a data da aplicação da Escala de Epworth foi superior a seis meses da realização da Polissonografia Basal Noturna.
Os sujeitos da pesquisa foram divididos em dois grupos de acordo com o IAH, seguindo critérios da International Classification of Sleep Disorders6: G1, pacientes sem o diagnóstico de SAHOS (IAH< 5 eventos/h) caracterizando o grupo controle; e G2, pacientes com diagnóstico confirmado de SAHOS (IAH> 5 eventos/h). Este último ainda foi dividido em três subgrupos: G2.1, pacientes com SAHOS leve (IAH entre 5 e 15 eventos/h); G2.2, pacientes com SAHOS moderada (IAH entre 15 e 30 eventos/h); e G2.3, pacientes com SAHOS grave (IAH> 30 eventos/h).
Para análise descritiva dos dados utilizou-se médias, desvio padrão e tabelas 2X2 para relacionar os dados quali-qualitativos, através do Software Microsoft Excel 2013. A análise estatística deu-se através do coeficiente de correlação de Pearson que determina a relação linear entre duas variáveis aleatórias para verificar a existência de uma correlação positiva ou negativa, e o programa utilizado foi o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Statistics) versão20.0. Foi considerada a significância de p=≤ 0,05
A sensibilidade da ESE foi calculada pela divisão do número de pacientes verdadeiros positivos (VP), o que corresponde aos pacientes que apresentam SDE e que têm diagnóstico de SAHOS, pela soma entre VP e falsos positivos (FP), ou seja, pacientes que têm SDE e não apresentam SAHOS, expressa pela seguinte fórmula: SENS = VP/VP+FP. Já a especificidade da ESE foi calculada pela divisão do número de verdadeiros negativos (VN), ou seja, os pacientes que não têm SDE e também não têm o diagnóstico de SAHOS, pela soma do número de VN e falsos negativos (FN), que corresponde ao grupo de pacientes que não têm SDE, porém têm SAHOS, que é expressão pela fórmula: ESP = VN/VN+FN.
O presente estudo seguiu as normas e diretrizes da Resolução 466/12. Sua realização foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da EMESCAM sob nº 044/2010.
Foram analisados 104 prontuários. Destes, 39 foram excluídos do presente estudo em concordância com os critérios de exclusão, permanecendo uma amostra total de 65 prontuários.
Com base no IAH, a amostra foi dividida em G1 ou grupo controle, composto por 11 pacientes sem SAHOS (17%), e G2, grupo com diagnóstico confirmado de SAHOS, composto por 54 pacientes (83%). Estes ainda foram divididos em 3 subgrupos: G2.1 com 3 pacientes (6%) classificados com SAHOS leve; G2.2 com 13 pacientes (24%) com SAHOS moderada; e G2.3 com 38 pacientes (70%), com SAHOS grave. A tabela 1 apresenta as características da amostra total estudada e dos grupos G1 e G2 separadamente.
Tabela 1: Caracterização da Amostra
Amostra Total | G1 | G2 | ||
IAH | 34,31 ± 25,11 | 2,07 ± 1,56 | 40,88 ± 18,78 | |
Idade* | 55,18 ± 15,76 | 46,68 ± 13,41 | 56,73 ± 15,18 | |
ESE | 9,63 ± 4,79 | 11,09 ± 3,73 | 9,33 ± 4,96 | |
Sexo | M | 68% | 36% | 74% |
F | 32% | 64% | 26% | |
*Amostra: n=57; G1: n= 9; G2: n= 48; ESE = Escala de Sonolência de Epworth; IAH = Índice de apneia/hipopneia | ||||
Fonte: Própria autora |
Na associação entre SAHOS e SDE, encontramos na amostra total uma prevalência de 52% (34) de pacientes com SDE, quando analisados separadamente. Dos 54 pacientes com diagnóstico de SAHOS (G2), 27 (50%) apresentaram SDE. Já no G1, grupo controle, a SDE estava presente em 7 (64%) dos pacientes (n=11), conforme demonstrado na tabela 2.
Tabela 2: Associação entre SAHOS e SDE
SAHOS SDE | Sim | Não | Total |
Sim (G2) | 27 | 27 | 54 |
Não (G1) | 7 | 4 | 11 |
Total | 34 | 31 | 65 |
SAHOS = Síndrome da apneia/hipopneia obstrutiva do sono; SDE = Sonolência excessiva diurna
Fonte: Própria autora
Ao relacionarmos a presença de SDE e a gravidade da SAHOS, obtivemos o seguinte resultado: no grupo G2.1, SAHOS leve (n=3), 2 (66,6%) pacientes apresentaram SDE, no grupo G2.2, SAHOS moderada (n=13), encontramos 6 (46,1%) pacientes com SDE e no grupo G2.3, SAHOS grave (n= 38), encontramos 19 (50%) pacientes com SDE, como resumido nas tabelas 3, 4,
Tabela 3: Associação entre SAHOS leve e SDE
SAHOS leve SDE | Sim | Não | Total |
Sim (G2.1) | 2 | 1 | 3 |
Não | 32 | 30 | 62 |
Total | 34 | 31 | 65 |
SAHOS = Síndrome da apneia/hipopneia obstrutiva do sono; SDE = Sonolência excessiva diurna
Fonte: Própria autora |
Tabela 4: Associação entre SAHOS moderada e SDE
SAHOS moderada SDE | Sim | Não | Total | |||||
Sim (G2.2) | 6 | 7 | 13 | |||||
Não | 28 | 24 | 52 | |||||
Total | 34 | 31 | 65 | |||||
SAHOS = Síndrome da apneia/hipopneia obstrutiva do sono; SDE = Sonolência excessiva diurna | ||||||||
Fonte: Própria autora | ||||||||
Tabela 5: Associação entre SAHOS grave e SDE
SAHOS grave SDE | Sim | Não | Total |
Sim (G2.3) | 19 | 19 | 38 |
Não | 15 | 12 | 27 |
Total | 34 | 31 | 65 |
SAHOS = Síndrome da apneia/hipopneia obstrutiva do sono; SDE = Sonolência excessiva diurna | |||
Fonte: Própria autora |
Tabela 6: Sensibilidade e especificidade da ESE e gravidade da SAHOS
Gravidade da SAHOS | n | ESE | |
Sensibilidade | Especificidade | ||
SAHOS Leve | n=3 | 5,8% | 96% |
SAHOS Moderada | n=13 | 17,6% | 77,4% |
SAHOS Grave | n=38 | 55,8% | 38,7% |
SAHOS = Síndrome da apneia/hipopneia obstrutiva do sono; ESE = Escala de Sonolência de Epworth |
Fonte: Própria autora
Ao realizar a correlação de Pearson entre o IAH com o grau de SDE da amostra total, não encontramos dados estatisticamente significantes (p = > 0,05). O mesmo ocorreu na correlação entre o IAH e a idade dos pacientes analisados no presente estudo. Entretanto, ao correlacionar idade e SDE, encontramos uma correlação fraca e negativa (r = – 0,24) e estatisticamente significativa (p = < 0,05), como representado no gráfico 1. Gráfico 1: Correlação entre IDADE e SDE
Tangerina et al10 em estudo similar ao apresentado, estudaram os achados polissonográficos de 45 pacientes com e sem SAHOS e encontraram uma média geral do IAH de 30,8 ± 31,9 eventos por hora de sono, valor que se se aproxima da média encontrada neste estudo, que foi de 34,31 ± 25,11. Voltando a assimilar-se com o presente estudo, eles dividiram sua amostra total em pacientes com e sem SAHOS, ou seja, pacientes com IAH > 5eventos/he < 5eventos/h, respectivamente. No grupo com SAHOS, um total de 35 (78%) pacientes, a média do IAH encontrado foi de 38,7 ± 32 e no grupo sem SAHOS, 10 (22%) pacientes, 2,96 ± 1,6, enquanto que neste estudo a porcentagem encontrada entre pacientes com e sem SAHOS foi de 83% contra 17% e a média do IAH para o grupo com SAHOS foi de 40,88 ± 18,78 e para o grupo sem SAHOS, 2,07 ± 1,56, demonstrando novamente as similaridades nos achados entre ambos os estudos. Na estratificação dos pacientes, de acordo com a gravidade da SAHOS, o grupo G2 foi dividido em subgrupos, nos quais encontramos uma prevalência de 6% (3) de SAHOS leve, 24% (13) de moderada e 70% (38) de SAHOS grave. Knorst, Souza e Martinez11 analisando 300 pacientes atendidos em uma clínica do sono, com diagnostico confirmado de SAHOS, encontraram resultados similares ao dividirem a sua amostra utilizando os mesmos critérios que foram utilizados no estudo em discussão. A prevalência encontrada foi de: 12% (36) de pacientes com SAHOS leve; 17,3% (52) com SAHOS moderada; e 69,3% (208) com SAHOS grave.
Ainda analisando a variável perfil do paciente, pôde-se observar que, em relação à idade, a média obtida neste estudo foi de 55,18 ± 15,76 variando de 21 a 85 anos, corroborando com a literatura pesquisada, que apresenta as idades entre 50 e 60 anos como um importante fator de risco para o desenvolvimento da SAHOS. Entretanto, estudos mais recentes têm mostrado uma média de idade cada vez menor, como, por exemplo, o estudo realizado por Rodrigues et al,12 em que 112 pacientes atendidos em um Ambulatório de SAHOS foram estudados e a média de idade encontrada foi de 47,95 ± 11,25 com uma variação de 17 a 77 anos.
Quando comparamos as médias de idade entre o G1 e o G2, encontramos uma diferença de pouco mais que 10 anos entre elas, (46,68 ± 13,41 vs. 56,73 ± 15,18 anos), dado este que vem de encontro com estudos de Carvalho7 que afirmam que o avançar da idade é diretamente proporcional ao aumento na incidência da SAHOS.
O efeito da idade sobre a prevalência da SAHOS merece ser mais bem esclarecida. No entanto, os estudos tendem a ser coesos ao afirmarem que existe uma correlação positiva entre idade, obesidade e circunferência do pescoço, ou seja, o peso e a circunferência do pescoço, que integram a lista de fatores de risco para SAHOS, aumentam proporcionalmente com o avançar da idade, o que a torna também um fator de risco para a doença.13
Quanto ao sexo, os pacientes do sexo masculino configuraram 68% (44) da amostra deste estudo, e esse índice foi ainda maior quando se avaliou apenas o grupo com SAHOS, G2, em que 74% da amostra eram do sexo masculino. Em contrapartida, avaliando-se o G1, grupo controle, apenas 36% dos pacientes foram do sexo masculino. Em estudos, Daltro et al,14 encontraram uma porcentagem muito próxima à apresentada. Dentre os 1.595 pacientes estudados, do Laboratório de Sono do Hospital Português em Salvador/Brasil, 71,7% eram do sexo masculino. Em outro estudo, Dal-Fabbro et al,2 analisaram 50 pacientes com diagnóstico polissonográfico de SAHOS e, dentre estes, 66% eram do sexo masculino, demonstrando novamente as similaridades entre os resultados obtidos neste estudo e os contidos na literatura.
Entretanto, Malhotra e White15 em seu estudo de revisão bibliográfica ressaltam que, embora estudos mais recentes confirmem que a SAHOS acomete mais os indivíduos do sexo masculino, deve-se atentar para o fato de que as mulheres podem estar sendo subdiagnosticadas. Collop, Adkins e Philips16 e Musmam17 complementam, ainda, dizendo que a apneia do sono tem uma apresentação clínica mais expressiva nos homens, com maior frequência de ronco e apneia testemunhada. Nas mulheres a apneia tende a cursar com sintomas menos específicos tais como sonolência e fadiga, sinais estes que são facilmente confundidos com o estresse diário, ou simplesmente ignorados, o que faz com que essas pacientes sejam menos frequentemente encaminhadas à polissonografia.
No que tange a SDE, encontramos uma prevalência de 52% de SDE e no comparativo entre os grupos. Esse índice foi ainda maior no grupo controle. As médias obtidas através da pontuação da Escala de Sonolência de Epwoth também divergiram quando ambos os grupos foram comparados, tendo o grupo controle, novamente, obtido índices superiores aos encontrados no grupo com SAHOS. Isso demonstrou a baixa sensibilidade dessa escala na triagem dos pacientes portadores dessa doença.
Gondim et al3 realizaram um estudo retrospectivo com 125 pacientes com e sem SAHOS e encontraram, dentre outros achados homogêneos aos nossos, uma prevalência de 54,4% de pacientes com SDE na população geral, entretanto no comparativo entre as populações com SAHOS grave e moderada e com SAHOS leve e sem SAHOS os achados demonstraram uma prevalência significativamente maior neste primeiro grupo. Corroborando com Gondim et al3, Boari et al18 realizaram um estudo com 66 pacientes que foram submetidos à polissonografa e que haviam respondido à ESE. Não foi encontrada correlação entre os parâmetros em pacientes com SAHOS leve e moderada, porém foram observados valores estatisticamente significativos em pacientes com a forma grave da doença. 65% dos pacientes tiveram valores anormais de sonolência.
Ao correlacionarmos o IAH com a pontuação da Escala de Epworth, não encontramos uma correlação estatisticamente significativa. Em estudos, Musman et al17 ao analisarem 323 pacientes submetidos à polissonografia por suspeita prévia de distúrbio do sono, também não encontraram uma correlação significativa entre a sonolência medida pela Escala de Epworth e a SAHOS. O autor em questão relaciona o achado à subjetividade e problemas relacionados ao desempenho da própria escala.
No que concerne a SDE, achados discordantes estão sempre em evidência na literatura, uma vez que a sonolência se torna, a cada dia mais, um sintoma frequente em toda a população em decorrência do aumento das exigências diárias empregadas aos indivíduos.
No Estudo realizado por Bittencourt et al,19 em que 2.110 indivíduos de 150 diferentes cidades brasileiras foram entrevistados pelo Instituto Datafolha e questionados, dentre inúmeros outros assuntos, sobre queixas do sono, foi encontrado que 63% da população entrevistada apresentaram pelo menos uma queixa relacionada ao sono. Com isso, podemos conjecturar que a baixa qualidade do sono associado a uma jornada árdua de trabalho durante o dia, pode levar esses indivíduos a apresentar SDE sem que necessariamente sejam portadores da SAHOS. Quando se leva em consideração que, neste estudo, a população do grupo controle que obteve maiores índices de SDE encontram-se no auge da faixa etária economicamente ativa, esse fato torna-se ainda mais evidente, o que nos leva a questionar a eficiência da ESE em diferenciar pacientes com SAHOS daqueles que não possuem da doença.
Outro dado que vem de encontro ao exposto acima é que ao equipararmos a sonolência com a idade dos indivíduos da amostra, obtivemos uma correlação fraca, negativa e estatisticamente significativa, ou seja quanto menor foi a idade maior foi o índice de sonolência da população. O que nos leva a pensar novamente no fato de que a população jovem apresenta-se cada vez mais sonolenta, mesmo sem apresentar algum distúrbio respiratório do sono.
De acordo com Chervin,9 apesar de ser larga e mundialmente utilizada para medir a sonolência, ainda pairam dúvidas sobre o que realmente a Escala de Sonolência de Epworth mede. Ele alega, ainda, que todos os autores que utilizam essa escala estão certamente medindo a mesma coisa. Porém, na ausência de um completo entendimento do processo fisiológico que desencadeia a sonolência, a melhor maneira de medi-la ainda permanece vaga, colocando em dúvida, portanto, a sensibilidade desta escala, principalmente como determinante para a predisposição da SAHOS ou de qualquer outra doença específica.
A prevalência da sonolência excessiva diurna (SDE) neste estudo foi de 52% na população total. Os indivíduos foram, em sua maioria, do sexo masculino, a média de idade foi de 55,18 ± 15,76 anos, com média do IAH de 34,31 ± 25,11 eventos por hora de sono e de ESE, 9,63 ± 4,79.
Ao confrontar o IAH com o grau de SDE, não encontramos dados que possam ser afirmados com veracidade por não serem estatisticamente significativos. O mesmo ocorreu na correlação entre o IAH e idade dos pacientes. Já confrontando idade e SDE, encontramos uma correlação fraca e negativa, porém estatisticamente significativa.
A SDE foi encontrada em metade dos pacientes com SAHOS, apresentando baixos valores de sensibilidade e especificidade, além de estar presente na maioria dos pacientes sem SAHOS, levando-nos a crer que a Escala de Epworth não pode ser um instrumento único ao ser utilizado com objetivo de detectar a presença da SAHOS, e que se faz necessária a aplicação de outros testes avaliativos que possam melhorar a predição desses distúrbios, otimizando a indicação da polissonografia.
Ressaltamos, ainda, a necessidade de novos estudos relacionados à sonolência excessiva diurna para uma melhor elucidação dos indivíduos envolvidos com esse problema tão comumente relacionado a acidentes, desenvolvimento de morbidades cardiovasculares, que vêm se tornando um importante problema de saúde pública.
Gracielle Pampolim¹; Juliana Moreira Pires²; Roberta Barcellos Couto3; Roberta Ribeiro Batista4
1 Mestre em Políticas Públicas e Desenvolvimento Local formada pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória – EMESCAM, Fisioterapeuta, Professora do Curso de Graduação em Fisioterapia da Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória – EMESCAM.
2 Fisioterapeuta formada pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória – EMESCAM.
3 Médica formada pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória – EMESCAM. – Pneumologista no Centro de Medicina do Sono – MEDSONO.
4 Mestre em Engenharia Biomédica formada pela Universidade do Vale do Paraíba, Fisioterapeuta, Professora e Coordenadora do Curso de Graduação em Fisioterapia da Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória – EMESCAM.